Sogra de vítima de feminicídio diz que previu morte da nora: 'eu senti'

Márcia e Ricardo tinham dois filhos; ele foi preso após invadir casa da ex e esfaqueá-la até a morte (Foto: Reprodução)

Mãe de algoz também chora. A ambulante Edna Oliveira, 59 anos, mal consegue ficar em pé. Um dos motivos é por conta de um acidente recente que lhe causou uma fratura no fêmur. A outra dor, difícil de sarar e que não cabe cuidados médicos, é saber que seu filho assassinou sua nora, nesse domingo (2), por não aceitar o fim do relacionamento de cinco anos.

Ricardo Oliveira Conceição, 36, matou a ex-companheira, a manicure Márcia Silva Nascimento, 29, depois de arrombar uma janela e invadir o prédio em que ela morava no final de linha do bairro de Jardim Santo Inácio, em Salvador. O casal tinha dois filhos, um menino de 3 anos e outro de 5.

Poucas mães têm a coragem que a ambulante teve: de receber em sua casa uma equipe de reportagem que buscava entender os motivos pelos quais levaram o homem a cometer o feminicídio contra uma pessoa que ele jurava amar. A ambulante, no entanto, não apenas abriu o portão de casa, mas abriu, também, o seu coração, ferido pela atitude de um dos seus sete filhos. Mais que isso, contou que teve a visão antecipada do que poderia ocorrer, mas não conseguiu evitar o pior.

No dia do crime, Edna acordou com um mau pressentimento: sabia que naquele dia algo muito ruim poderia acontecer no seu seio familiar.

Era um presságio que já havia acontecido algumas vezes, e que, em todos os casos, terminou com um final trágico – a ambulante conta que também previu que dois de seus filhos seriam assassinados, o que de fato acabou acontecendo. Mária vai ser enterrada nesta terça-feira (4), às 10h, no Cemitério Municipal de Plataforma.

Confira o relato da mulher, que alertou à ex-nora sobre o perigo que corria e a orientou a fugir no dia do crime: 
Aviso - "Eu encontrei com ela na rua de casa, por volta das 11h30. Eu senti naquele dia que algo ruim poderia acontecer. Eu disse para minha nora: 'a sábia edifica a sua casa e a tola destrói. Vá para a igreja. Jesus está te esperando de abraços abertos. Só Jesus pode te salvar. Se você não for, acabará morrendo nos braços dele'. Por volta das 17h, aconteceu."

Jogo de inferno - "Eu estava pressentindo que poderia acontecer. A vida dos dois era um 'jogo de inferno'. Mas ninguém pode tirar a vida do outro. Há mais ou menos uma semana ela mandou uma mensagem para ele terminando e dizendo que estava com outro. Ele criou muita revolta. Porque você sabe, né? O homem trai, mas não quer ser traído. Eu não sabia que ontem seria o último dia que eu veria os dois. Meu filho ficou preso por quase nove meses depois de agredi-la, mas ela decidiu voltar assim que meu filho deixou a prisão. Eu disse: 'você é uma louca, o que está fazendo aqui, Márcia? Como você, que sofreu tanto na mão dele, teve coragem de voltar? Quem ama trai?'".

Vício - "Mas a culpa de tudo isso são as drogas. Desde a adolescência eu sofro com o meu filho que é usuário de cocaína e crack. Sem as drogas ele era um bom filho, um bom pai, um bom marido... Ninguém é passarinho para morrer dessa forma. Até quem mata um animal precisa pagar pelo erro. Com todo defeito que a vida possa ter, ninguém merece perdê-la, num crime tão brutal assim. Olha aqui o áudio que eu mandei para ele depois de ter o mau pressentimento e minutos antes de acontecer o crime."

Áudio (descrição) - "'Olha, cuidado, não vá pegar Márcia para espancar. Tá ouvindo o que eu estou te falando, tá, Ricardo? Vá viver em paz com Deus, não espanque sua mulher, não, rapaz... Sua mulher lhe ama, gosta de você, se submete a tantas coisas por você. Saiba dar valor. Caramba, toma juízo. Crie seus filhos, pelo amor de Deus, se apegue com ele. Fique em paz com ele, meu filho.'"

Presságio - "Eu senti. Senti. Eu tenho o dom de sentir quando alguém vai morrer e, se a pessoa não obedecer, morre. Desde criança carrego esse dom comigo. Se você encontrar a família dela, por favor, dê meus pêsames e diga que eu sinto muito por tudo o que aconteceu. Diga que também estou sofrendo igualzinho porque também sou mãe. Sinto por ela e pelo meu filho por ter cometido essa tremenda besteira. Se ela tivesse seguido o meu conselho, talvez estivesse viva..."

Fonte: Correio*