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Tenho ela viva ainda, diz pai de grávida morta por marido antes de dar à luz

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Tenho ela viva ainda, diz pai de grávida morta por marido antes de dar à luz

Por: G1

Daiane Reis Mota foi assassinada pelo marido em dezembro de 2017 (Foto: Arquivo pessoal)

 

As horas de dor e angústia à busca da filha desaparecida às vésperas do parto ainda estão latentes na voz do comerciante Rubem Oliveira Mota, de 56 anos.

A esperança de encontrar a filha viva deu lugar à luta por justiça quando o corpo foi achado no dia 17 de dezembro de 2017. A jovem Daiane Reis Mota, de 25 anos, foi assassinada com um tiro na nuca pelo marido, Adilson Prado Lima Júnior. Ele ainda ajudou a família a procurar a vítima após o suposto sumiço.

O caso da jovem de Serrinha, cidade a 180 quilômetros de Salvador, é um dos 74 feminicídios registrados na Bahia em 2017, segundo dados da Ouvidoria Geral de Polícia da Secretaria de Segurança Pública do estado. As narrativas alegadas pelos acusados dos crimes, como o ciúme, se repetem e tentam esconder a principal motivação: a condição de ser mulher.

“Ela morreu só na mente dos outros porque eu tenho ela viva ainda”, diz o pai da jovem em entrevista. O bebê que Daiane esperava, fruto do relacionamento com o acusado, iria nascer no dia 18 de dezembro de 2017, quando estava marcado o parto cesáreo da vítima. E, nesse mesmo dia, ela foi enterrada sob forte comoção. Os planos da jovem, segundo Rubem, eram os melhores.

"Daiane estudava em Feira de Santana. Fazia nutrição. E trabalhava durante o dia em uma farmácia. Ela sonhava em ser alguém na vida e dar tudo de melhor para os filhos dela", lembra Rubem. A jovem deixou um filho, fruto de outro relacionamento, que está prestes a completar 3 anos e ainda não sabe o que aconteceu com a mãe.

"Nós estamos fazendo de tudo para que ele não fique sabendo o que aconteceu. Ele está com a gente e estamos lutando pela guarda dele. Ele sempre foi criado pela mãe e por nós. Esperamos que a Justiça olhe por nós também nesse caso porque fazemos de tudo por ele”, conta Rubem, que é casado com a mãe de Daiane, Maria das Graças Silva Reis, há cerca de 25 anos.

A família convive com a dor da perda e a busca por Justiça. "Com certeza a gente vai vencer. Dependemos muito da justiça de Deus e depois a justiça da terra, que com certeza essa não vai falhar também não”, acredita o comerciante.
Pela primeira vez, Rubem Mota fala sobre o crime.

Veja o relato:
16 de dezembro de 2017 - Dia do crime:
10h - “O último contato que tive com ela foi no sábado mesmo, no dia do ocorrido, que eu levei ela para levar o filho para o pai e os avós. Em seguida, levei Daiane para fazer a sobrancelha, pois ela estava se arrumando para, na segunda-feira, fazer o parto cesáreo. Então, ela estava terminando de se arrumar para o parto".

12h - "Quando foi mais tarde, 12h30 para 13h, ela voltou com esse assassino para almoçar. E aí, foi quando, em média de 14h para 14h30, ela saiu com ele e pegou a chave do carro na mão de meu filho. Essa foi a última vez que eu falei com ela”.

16h - "A outra avó veio trazer o menino, fui, bati na porta, chamei ela e vi que ela não estava em casa. Liguei pra ela e o celular deu caixa. Aí disse para avó que ela não estava e que depois passava para buscar a criança. Mais tarde, minha esposa se sentiu mal e voltou para casa, como se estivesse pressentindo algo de errado. Foi então que começamos a nos preocupar com Daiane".

17h - "Eu liguei para a outra avó perguntando se ela já tinha ido buscar o filho, e ela disse que não. Foi quando eu ouvi os berros, os gritos do monstro. Quando descemos, ele já estava indo embora e disse que estava falando com o Gabriel, irmão de Daiane, que ela tinha sumido. E aí começou o sofrimento”.

18h - “Foi uma luta a noite toda. O monstro e o pai dele também começaram a procurar Daiane e ficavam colocando a culpa no ex-marido dela, dizendo que tinha sido ele. Eu queria ir com ele para registrar queixa e ele tirou de tempo. Ele dizia que não, que isso não procedia, que delegacia só depois de 24 horas para registrar desaparecimento, para evitar o flagrante".

20h - "Ele [o autor do crime] encontrou uma viatura da Polícia Militar e pediu ajuda e disse que Daiane tinha sumido. Foi quando o pessoal da polícia disse que talvez ela tivesse ido a uma festa de final de ano, uma confraternização do pessoal da farmácia. E nisso, nós fomos lá e ela não estava. E foi aquela correria, aquele sofrimento. Foi a noite toda assim. Nós da família e o assassino atrás de Daiane"

17 de dezembro de 2017 - Corpo é achado:

8h - "Quando foi de manhã, foi que já não tinha mais para onde correr. A gente foi registrar queixa na delegacia. Adilson voltou, sentou na delegacia e registrou queixa com a cara mais cínica e com o sangue frio dele".

9h - "Quando voltamos para casa foi que meu filho recebeu a mensagem de um ciclista dizendo que tinha encontrado um corpo parecido com o dela e aí o sofrimento foi maior ainda. A gente desmaiou, passou mal e tudo".

16h - “Eu já estava desconfiado quando a polícia pediu que o carro da gente ficasse lá na delegacia para fazer vistoria. Já estava desconfiado pelo tempo que ele estava lá na delegacia para dar entrada no Departamento de Polícia Técnica para trazer o corpo dela para o velório. E aí eu vi pela demora que alguma coisa de errado estava acontecendo com ele".

18h - "Na correria, à noite, no velório dela, foi que ficamos sabendo que ele estava sendo detido. Ele não participou do velório. Eu mesmo só fiquei sabendo já tarde um pouco, que eu fiquei sabendo que tinha sido ele. Minha esposa ainda estava duvidando, acreditando nele, mas aí depois contaram a ela e vimos que não tinha mais o que fazer”.

O que diz a família:
Rubem Mota acredita que Adilson Prado Lima Júnior já se preparava para cometer o crime. O motivo alegado pelo acusado à polícia foi o ciúme após ele ter lido mensagens de whatsapp da vítima. “Não teve nada de traição. A conversa que ele desconfiou era uma conversa normal com o patrão dela. Até o delegado disse que não tinha nada que justificasse esse ciúme”.

A hipótese de premeditação do assassinato levantada por Rubem é devido ao celular de Daiane ter desaparecido quando a família ainda procurava por ela. "Meu filho e uma amiga dela tentaram localizar o celular dela para rastrear. O celular indicou a casa dela e ele tirou de tempo. O crime foi premeditado. Ele já vinha arquitetando isso há muito tempo”, conta o comerciante.

O caso é acompanhado de perto pela família da vítima. "Estamos acompanhando com a melhor criminalista da cidade e com certeza esse crime não vai ficar impune", afirma Rubem Mota. Para ele, o caso de Daiane, assim como tantos outros casos devem ter repercussão na sociedade e, principalmente, atenção redobrada da Justiça. "Aconteceu comigo e está acontecendo com muita gente. Por isso que eu digo que a justiça tem que tomar conta disso. Nós fizemos uma caminhada para chamar atenção para a morte de mulheres".

Adilson Prado Lima Júnior suspeito de matar a esposa grávida de oito meses na cidade de Serrinha, na Bahia (Foto: Divulgação/SSP-BA)

O que diz a Justiça:
Adilson Prado Lima Júnior, de 25 anos, confessou ter matado Daiane Reis Mota. Ele foi preso no dia 17 de dezembro, quando o corpo da vítima foi achado e imagens de câmeras de segurança mostraram ele e Daiane dentro do carro da família dela, o que despertou a suspeita da polícia.

O acusado havia denunciado, inicialmente, o desaparecimento da vítima, depois de sair para fazer compras, mas a polícia desconfiou da versão dele. Após confessar o crime, Adilson contou que chegou a esconder pertences para dificultar a identificação da vítima. Ele foi indiciado por feminicídio.

Após a conclusão do inquérito policial, o Ministério Público ofereceu denúncia à Justiça, segundo a promotora Ana Carolina Campos, que cuida do caso. Segundo ela, a prisão preventiva de Adilson foi decretada pela Justiça no dia 19 de dezembro.

Inicialmente, ele seria levado para o presídio de Feira de Santana, pois é o trâmite normal dos presos provisórios. Porém, após um pedido do advogado de defesa do acusado, ele foi transferido para o presídio de Serrinha, que é de segurança máxima.

"O advogado dele alegou que havia uma ameaça de agressão por outros detentos lá em Feira de Santana. E o delegado também alertou para isso. Foi esse o motivo dele ter sido levado para Serrinha, onde permanece preso", conta a promotora. Apesar de toda a segurança do presídio, Adilson Prado chegou a ser agredido por outros presos. E, atualmente, segue sozinho em uma cela.

No próximo dia 16 de março, uma audiência de instrução está marcada para ouvir as testemunhas e também o acusado, segundo informou Ana Carolina Campos. A advogada contratada pela família de Daiane está como assistente de acusação, pois o MP é o titular da ação penal.

Terminada a audiência de instrução, as partes vão prestar alegações finais e a juíza vai encaminhar decisão. "O mais provável é que ele vá ser encaminhado para o tribunal do júri. A defesa pode recorrer e o processo vai esperar o recurso ser julgado pelo Tribunal de Justiça da Bahia. Tem todo um trâmite até acontecer o julgamento", detalha Ana Carolina.

 

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